Para quem acha que os outros primatas não têm a capacidade de planejar (de Erline Machado)...
Orangotangos planejam viagens
Estudo produzido pela Universidade de Zurique, na Suíça, indica que a
capacidade de planejar uma viagem não é exclusiva dos humanos. Os
resultados da pesquisa, publicada na edição de hoje da revista Plos One,
sugerem que os orangotangos conseguem programar longos deslocamentos
com antecedência e, ainda, informar o roteiro a membros da mesma
espécie.
Na análise, os autores
estudaram mais de 200 sons emitidos por 15 machos selvagens que habitam
o santuário de Suaq Balimbing, na Indonésia. A análise levou à
conclusão de que algumas vocalizações servem para comunicar a direção a
ser tomada, o que costuma ser feito na noite anterior à partida. Pela
manhã, caso decidam mudar os planos anunciados, os bichos podem emitir
outros sons, atualizando as informações.
Longas vocalizações,
muito altas e audíveis a 1km de distância, são comuns entre orangotangos
machos adultos. Essa é uma das formas pelas quais eles organizam a
hierarquia do grupo e atraem as fêmeas. O anúncio da rota de viagem
busca justamente cumprir essas funções. É como se os machos mandassem
duas mensagens: às parceiras, eles informam para onde elas devem ir, e,
aos machos que ocupam as posições mais baixas, dizem de onde devem ficar
longe.
A estratégia ajuda as fêmeas a se deslocarem até o
macho pelo qual se sentem atraídas, o adulto, e a se afastarem dos mais
jovens, que as assediam constantemente. “Isso indica que existe uma
preferência delas pelos mais experientes”, diz Karin Isler, coautora do
trabalho, coordenado pela especialista em primatas Carel van Schaik. “O
resultado é consistente com uma ideia que já tínhamos, de que existe uma
preferência das fêmeas pelo macho mais poderoso e dominante”,
prossegue.
“Apenas machos maduros, com abas ou falanges nas
laterais da face e do pescoço, emitem esses sons. Talvez essa
característica da fisionomia exista justamente para concentrar a energia
do som na direção que desejam emitir a chamada”, especula Isler,
indicando ainda que as fêmeas em idade reprodutiva sentem-se atraídas
apenas pelos orangotangos que já possuem abas.
Os resultados
do trabalho surpreendem o biólogo Anderson Mendes, gerente de Biologia
do Jardim Zoológico do Rio de Janeiro. Isso porque, notoriamente, esses
primatas são pouco sociáveis, e chamar os colegas seria uma contradição
aos hábitos conhecidos até agora. “Eles são os mais solitários dos
grandes primatas, com machos muito territorialistas, que encontram as
fêmeas anualmente para copular. Sabíamos que os sons eram emitidos para
avisar aos outros que não chegassem perto. Então, eu, particularmente,
achei estranho e surpreendente que eles convidem os outros para
segui-los”, conta Mendes.
Cativeiro
Segundo Isler, os
sons emitidos indicam mais do que a direção. Eles também revelam a
identidade dos animais e possuem acústica diferente de outros avisos. A
última chamada, dada pouco antes de o macho maduro dormir, fornece uma
previsão da rota de viagem até as 16h do próximo dia. As mensagens são
enviadas quando os animais estão parados entre um galho e outro, e
geralmente duram 80 segundos. No entanto, o trabalho registrou chamadas
de até 4 minutos. “Os orangotangos dormem por volta das 18h, então a
última chamada é feita com cerca de 22 horas de antecedência. Esse dado
sugere que os machos adultos planejam sua rota um dia antes, entre
paradas para alimentação e descanso, e a anunciam àqueles que ficaram
para trás, em especial às fêmeas”, conta a autora.
Outros
grandes primatas, como chimpanzés e bonobos, possuem a mesma habilidade.
“Mas, até então, as observações eram feitas em animais de cativeiro. É
importante entender como esse processo acontece com primatas selvagens,
pois essa capacidade de planejamento poderia ser um subproduto da vida
em cativeiro nas habilidades cognitivas”, diz Isler.
Mendes
concorda. Ele lembra casos de chimpanzés de cativeiro que enganaram seus
tratadores escondendo “munições” que foram disparadas contra os
visitantes no dia seguinte à limpeza do espaço em que viviam. Esconderam
paus e pedras cuidadosamente no dia anterior para hostilizar quem se
atrevesse a chegar mais perto das jaulas. “Se, sempre que recebem
visitas, os macacos agridem os visitantes jogando coisas neles, enganar
os tratadores para que tenham munição suficiente para o dia seguinte
indica que há aí uma certa consciência e capacidade de prever o futuro.”
Essa habilidade, acredita o biólogo, constitui uma vantagem
evolutiva que pode ter aparecido a partir de pressões sociais, como as
vividas pelos humanos no início da existência da espécie. Esse
conhecimento pode ter sido passado de geração em geração ou pode ser
também um conhecimento inerente do animal.
O diretor do Centro
de Primatologia do Rio de Janeiro (CPRJ), Alcides Pissinatti, acredita
que o estudo pode ajudar na preservação dos animais. “Eles fazem
trajetórias mais ou menos circulares em busca de frutos. Orangotangos
têm o quociente de inteligência muito avançado e vocalizam para se
comunicar. A degradação do ambiente faz com que criem novas habilidades,
e o conhecimento dessas rotas de viagens pode ajudar os pesquisadores a
mapear as regiões que estão mais danificadas. Assim, seria mais fácil
estabelecer ações de conservação efetivas”, analisa.
E mais um artigo, esse em inglês. Macacos aprendem a flexibilidade verbal vivendo em grupos:
http://www.npr.org/2013/09/13/216440443/what-a-chatty-monkey-may-tell-us-about-learning-to-talkhttp://www.npr.org/2013/09/13/216440443/what-a-chatty-monkey-may-tell-us-about-learning-to-talk
sábado, 14 de setembro de 2013
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