sábado, 14 de setembro de 2013

Orangotangos planejam viagens

Para quem acha que os outros primatas não têm a capacidade de planejar (de Erline Machado)...

Orangotangos planejam viagens

Estudo produzido pela Universidade de Zurique, na Suíça, indica que a capacidade de planejar uma viagem não é exclusiva dos humanos. Os resultados da pesquisa, publicada na edição de hoje da revista Plos One, sugerem que os orangotangos conseguem programar longos deslocamentos com antecedência e, ainda, informar o roteiro a membros da mesma espécie.

Na análise, os autores estudaram mais de 200 sons emitidos por 15 machos selvagens que habitam o santuário de Suaq Balimbing, na Indonésia. A análise levou à conclusão de que algumas vocalizações servem para comunicar a direção a ser tomada, o que costuma ser feito na noite anterior à partida. Pela manhã, caso decidam mudar os planos anunciados, os bichos podem emitir outros sons, atualizando as informações.

Longas vocalizações, muito altas e audíveis a 1km de distância, são comuns entre orangotangos machos adultos. Essa é uma das formas pelas quais eles organizam a hierarquia do grupo e atraem as fêmeas. O anúncio da rota de viagem busca justamente cumprir essas funções. É como se os machos mandassem duas mensagens: às parceiras, eles informam para onde elas devem ir, e, aos machos que ocupam as posições mais baixas, dizem de onde devem ficar longe.

A estratégia ajuda as fêmeas a se deslocarem até o macho pelo qual se sentem atraídas, o adulto, e a se afastarem dos mais jovens, que as assediam constantemente. “Isso indica que existe uma preferência delas pelos mais experientes”, diz Karin Isler, coautora do trabalho, coordenado pela especialista em primatas Carel van Schaik. “O resultado é consistente com uma ideia que já tínhamos, de que existe uma preferência das fêmeas pelo macho mais poderoso e dominante”, prossegue.

“Apenas machos maduros, com abas ou falanges nas laterais da face e do pescoço, emitem esses sons. Talvez essa característica da fisionomia exista justamente para concentrar a energia do som na direção que desejam emitir a chamada”, especula Isler, indicando ainda que as fêmeas em idade reprodutiva sentem-se atraídas apenas pelos orangotangos que já possuem abas.

Os resultados do trabalho surpreendem o biólogo Anderson Mendes, gerente de Biologia do Jardim Zoológico do Rio de Janeiro. Isso porque, notoriamente, esses primatas são pouco sociáveis, e chamar os colegas seria uma contradição aos hábitos conhecidos até agora. “Eles são os mais solitários dos grandes primatas, com machos muito territorialistas, que encontram as fêmeas anualmente para copular. Sabíamos que os sons eram emitidos para avisar aos outros que não chegassem perto. Então, eu, particularmente, achei estranho e surpreendente que eles convidem os outros para segui-los”, conta Mendes.

Cativeiro
Segundo Isler, os sons emitidos indicam mais do que a direção. Eles também revelam a identidade dos animais e possuem acústica diferente de outros avisos. A última chamada, dada pouco antes de o macho maduro dormir, fornece uma previsão da rota de viagem até as 16h do próximo dia. As mensagens são enviadas quando os animais estão parados entre um galho e outro, e geralmente duram 80 segundos. No entanto, o trabalho registrou chamadas de até 4 minutos. “Os orangotangos dormem por volta das 18h, então a última chamada é feita com cerca de 22 horas de antecedência. Esse dado sugere que os machos adultos planejam sua rota um dia antes, entre paradas para alimentação e descanso, e a anunciam àqueles que ficaram para trás, em especial às fêmeas”, conta a autora.

Outros grandes primatas, como chimpanzés e bonobos, possuem a mesma habilidade. “Mas, até então, as observações eram feitas em animais de cativeiro. É importante entender como esse processo acontece com primatas selvagens, pois essa capacidade de planejamento poderia ser um subproduto da vida em cativeiro nas habilidades cognitivas”, diz Isler.

Mendes concorda. Ele lembra casos de chimpanzés de cativeiro que enganaram seus tratadores escondendo “munições” que foram disparadas contra os visitantes no dia seguinte à limpeza do espaço em que viviam. Esconderam paus e pedras cuidadosamente no dia anterior para hostilizar quem se atrevesse a chegar mais perto das jaulas. “Se, sempre que recebem visitas, os macacos agridem os visitantes jogando coisas neles, enganar os tratadores para que tenham munição suficiente para o dia seguinte indica que há aí uma certa consciência e capacidade de prever o futuro.”

Essa habilidade, acredita o biólogo, constitui uma vantagem evolutiva que pode ter aparecido a partir de pressões sociais, como as vividas pelos humanos no início da existência da espécie. Esse conhecimento pode ter sido passado de geração em geração ou pode ser também um conhecimento inerente do animal.

O diretor do Centro de Primatologia do Rio de Janeiro (CPRJ), Alcides Pissinatti, acredita que o estudo pode ajudar na preservação dos animais. “Eles fazem trajetórias mais ou menos circulares em busca de frutos. Orangotangos têm o quociente de inteligência muito avançado e vocalizam para se comunicar. A degradação do ambiente faz com que criem novas habilidades, e o conhecimento dessas rotas de viagens pode ajudar os pesquisadores a mapear as regiões que estão mais danificadas. Assim, seria mais fácil estabelecer ações de conservação efetivas”, analisa.



E mais um artigo, esse em inglês. Macacos aprendem a flexibilidade verbal vivendo em grupos:

http://www.npr.org/2013/09/13/216440443/what-a-chatty-monkey-may-tell-us-about-learning-to-talkhttp://www.npr.org/2013/09/13/216440443/what-a-chatty-monkey-may-tell-us-about-learning-to-talk

Nenhum comentário:

Postar um comentário